O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entregou nesta quarta-feira (6) ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva um plano emergencial para enfrentar os impactos do tarifaço imposto ao Brasil pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A medida americana, que eleva em 50% as tarifas sobre produtos brasileiros, causou forte apreensão em setores da indústria e do agronegócio.
O chamado plano de contingência foi elaborado com foco em proteger a economia nacional sem agravar a já delicada situação fiscal do país. As propostas, que incluem crédito facilitado, incentivo à produção interna e estímulo a novos mercados, devem ser oficializadas nos próximos dias pelo Palácio do Planalto.
Medidas em resposta ao tarifaço
Segundo Haddad, o plano traz soluções imediatas e estruturais. Entre elas, linhas de crédito para capital de giro, aumento das compras governamentais e flexibilizações tributárias. O objetivo central é proteger pequenos exportadores que não conseguem desviar sua produção para outros mercados fora dos EUA.
Durante entrevista em Brasília, Haddad destacou que as propostas devem ser enviadas ao Congresso por Medida Provisória (MP). Com isso, entram em vigor de forma imediata, mesmo antes da votação legislativa. A estratégia visa garantir rapidez diante dos prejuízos já sentidos por empresas brasileiras.
Lula descarta retaliação direta
Apesar de críticas à medida norte-americana, Lula sinalizou que o Brasil buscará o caminho da diplomacia. Em entrevista à agência Reuters, o presidente afirmou que “gastará todas as possibilidades de negociação” antes de cogitar retaliações.
“Eu poderia taxar produtos americanos, mas não farei isso. Não quero repetir o mesmo comportamento dos Estados Unidos”, declarou o presidente. Segundo ele, o foco será manter os empregos no Brasil e oferecer suporte a quem mais precisa, especialmente os pequenos produtores.
Indústria e agro querem agilidade
Desde o anúncio do tarifaço, em 9 de julho, a pressão dos setores produtivos por respostas do governo aumentou. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e entidades do agronegócio apresentaram pedidos diretos ao Ministério da Fazenda.
Do lado industrial, a CNI reduziu de 37 para 8 as medidas consideradas prioritárias. Entre elas: novas linhas de financiamento, devolução rápida de créditos tributários e implementação de barreiras antidumping para conter a entrada de produtos estrangeiros mais baratos.
Mário Sérgio Telles, diretor da CNI, reforçou que parte das medidas não geraria impacto fiscal. “Muitas dessas ações são técnicas e não custam ao Tesouro. Como o governo conhece o perfil exportador de cada empresa, pode atuar de forma direcionada”, explicou.
Medidas específicas para o agro
O agronegócio pede ações imediatas. A principal demanda é o aumento das compras governamentais de produtos perecíveis, como frutas, mel, peixes e açaí. Esses itens são difíceis de redirecionar rapidamente para novos mercados.
Além disso, há pedidos para adaptar regras que hoje restringem o uso de produtos in natura em alimentos processados. Um exemplo é a possibilidade de substituir essências artificiais por frutas reais, como mel natural em vez de aromatizantes.
Outra sugestão em análise é o aumento do teor mínimo obrigatório de frutas e sucos em bebidas industrializadas, medida que pode absorver a produção que perderá espaço no mercado americano.
Risco de demissões preocupa
Preservar empregos é uma das maiores preocupações do governo. Com exportações em queda, muitas empresas cogitam demissões. Para evitar isso, o plano prevê a retomada de mecanismos usados na pandemia, como o programa de redução de jornada e salário, com compensação parcial pelo governo.
Há também pedidos por flexibilizações trabalhistas temporárias, como autorização para férias coletivas de forma facilitada. A expectativa é preservar o vínculo empregatício enquanto o setor se reorganiza.
Veja os principais pontos do plano de contingência:
Crédito emergencial
O governo analisa a liberação de novas linhas de crédito para garantir o capital de giro das empresas afetadas. Exportadores também pedem soluções para contratos de adiantamento de câmbio (ACC), que envolvem riscos financeiros quando os pedidos são cancelados.
Compras governamentais
Produtos perecíveis, como frutas, pescados e mel, poderão ser comprados diretamente pelo governo. A medida busca evitar desperdícios e apoiar produtores que perderam acesso ao mercado dos EUA.
Tributos e impostos
Entre os pedidos está a devolução rápida de créditos tributários acumulados na cadeia de exportação. Como se trata de valores já pagos, não haveria impacto fiscal. Outra proposta seria o congelamento temporário de tributos, com parcelamento posterior.
Preservação do emprego
A proposta inclui a retomada de programas emergenciais para redução de jornada com subsídio estatal. Empresas também solicitam mais flexibilidade para afastar trabalhadores temporariamente sem rompimento contratual.
Congresso em crise e atenção redobrada
A proposta chega ao Palácio do Planalto em um momento conturbado no Congresso. Desde que Jair Bolsonaro foi colocado em prisão domiciliar, parlamentares da oposição têm dificultado votações, inclusive ocupando a mesa diretora em protestos.
Diante disso, o governo trabalha com a hipótese de editar MPs para não depender de votações imediatas. A estratégia busca garantir a aplicação das medidas enquanto o cenário político não se estabiliza.
Sem impacto fiscal?
A equipe econômica se esforça para desenhar medidas com o menor custo possível aos cofres públicos. “Temos que apoiar quem precisa, mas sem comprometer ainda mais as contas públicas”, ressaltou Haddad.
Segundo técnicos da Fazenda, algumas propostas – como as compras governamentais e a devolução de tributos – podem ser executadas com ajustes orçamentários internos. Já os financiamentos terão limites, e a prioridade será para pequenos exportadores.
Caminho da diplomacia
O Itamaraty também está envolvido nas tratativas. Lula defende que o Brasil recorra aos mecanismos da Organização Mundial do Comércio (OMC) antes de considerar qualquer resposta mais agressiva. “Queremos mostrar que o Brasil é confiável, mesmo diante de medidas hostis”, afirmou o presidente.
O plano entregue por Haddad abre várias frentes de atuação para mitigar os efeitos do tarifaço de Trump. Com foco em crédito, apoio à produção e manutenção do emprego, o governo tenta proteger os setores mais vulneráveis sem romper com os compromissos fiscais.
Agora, a decisão final está nas mãos de Lula, que deve anunciar nos próximos dias quais medidas entrarão em vigor. Até lá, empresários e trabalhadores seguem em alerta, à espera de ações concretas que aliviem o impacto de uma das mais duras sanções comerciais já enfrentadas pelo Brasil.
















